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Aqui pretendia, pois, chegar. E maís: à conclusão de que, vivendo o homem do
combate, se vê levada por este conceito a atribuir à luta sentimental todo a
sentido de viver e a ela devotar todas as forças, razões e anseios de devir, isolando-se
de outras solicitações da vida, indispensáveis a que se enriqueça. Mais assento
nisto quando leio Radiguet em Le Diable au Corps: Mas o amor, dizia consigo mesmo, trás certamente grandes compensações,
uma vez que é nele que o homem alcança toda e liberdade. Ou Lady Chatterley:
E teve que penetrar na paz sobre a terra
que representava aquele corpo doce e imóvel. Foi na verdade um momento de paz
perfeita.... Agora, depois destes dois exemplos, abalanço-me à ingénua
pergunta: será verdadeiro, inteligente, reduzir a liberdade humana a um ponto,
mesmo a um momento, tão falível e de validade tão restrita? Pergunto até se num mundo contradito nas
f orças que o movem, razão e instinto e instinto e razão podem dissociar-se em
tamanha escala.
Parece-me,
antes, que Lawrence, dizendo noutra ocasião que é necessário ter-se boa alma para
se poder amar esteve a um passo breve de definir o problema e de explicar a
essência do drama que tão corajosamente abordou sem todavia esclarecer. O mal
foi que não ousou o passo. Descurou de considerar como se molda a alma do
homem, qual o caminho de este a dignificar e, pois, de dignificar o Amor. Ainda
por este motivo, a revolta que proclamou contra as factores que impedem e contaminam
o Amor esvaiu-se de tão abstracta que era A angustiosa, necessidade de comunhão
que o atormentava contentou-a ele com o encontro sereno e compreensivo, mais exactamente,
com a togetherness a que tantas vezes
se refere. E bem difícil havia de ser que numa ilha de náufragos, como era então
o mundo saída da Guerra de 14, pudesse acontecer um encontro assim, sereno e
compreensivo…» In José Cardoso Pires, Histórias de Amor, colecção Os Livros das Três
Abelhas, Editorial Gleba, Lisboa, 1952, Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
Cortesia
E Gleba/JDACT