domingo, 22 de janeiro de 2012

BNP. A biblioteca de um escritor finissecular: Fialho de Almeida (1857-1911). «Personalidade complexa, se não contraditória, o escritor deixou uma obra desigual ou fragmentária, mas de importância literária incontornável no século XIX português, mercê de uma prosa finalmente reconhecida pelos seus pares no século XX»


Cortesia de bnp

Mostra. De 16 de Janeiro a 10 de Março de 2012. Sala de Referência.
«José Valentim Fialho de Almeida, nascido no seio de uma modesta família de Vila de Frades, de onde cedo partiu para a boémia lisboeta repartida com uma extensa actividade jornalística, retornou abastado ao Alentejo natal para morrer na vila de Cuba.
De permeio, o jovem José Valentim estudou num colégio da capital, passando depois «sete anos de emplastros e de pílulas» numa botica farmacêutica, enquanto não concluía, com mediocridade, os «cursos científicos» em Medicina que nunca veio a exercer. Na vida adulta, Fialho de Almeida penetrou o mundo das letras e da sociedade culta na capital de um Reino que fustigou, como de uma República que veio a rejeitar, usando «uma pena donde continuamente espirravam revoltas».
Personalidade complexa, se não contraditória, o escritor deixou uma obra desigual ou fragmentária, mas de importância literária incontornável no século XIX português, mercê de uma prosa finalmente reconhecida pelos seus pares no século XX. Escreveu, conforme autobiografou, com «a necessidade que há de escrever como se pensa e como se fala, límpido, claro, brutal, simples e certo, veemente ou plácido segundo o veio d’água do assunto, precipitado ou espraiado, consoante o temperamento emotivo de quem escreve, e sincero sempre, arrancado d’alma».
Mundano, com um olhar sociológico abundante nos textos de crítica e crónica que dispersou em jornais, numa época de viragem na história portuguesa, foi um exemplar típico do intelectual finissecular, cuja biblioteca particular, objecto de doação à Biblioteca Nacional, é uma fonte de estudo desafiante na ocasião do centenário da morte.


Cortesia de bnp

Na sequência do legado da livraria particular do escritor à Biblioteca Nacional, cujo Catálogo Geral a instituição concluiu e publicou em 1914, foi criada uma Sala Fialho de Almeida com as estantes do escritor, conforme política então seguida por Júlio Dantas, na qualidade de Inspetor das Bibliotecas Eruditas e dos Arquivos.
O estudo desse acervo bibliográfico pode constituir uma análise de caso, não apenas no sentido de aferir as múltiplas influências literárias sobre a sua obra numa época em que, aos romantismos tardios ou requentados, se sobrepusera um naturalismo rapidamente em crise, os decadentismos de fim-de-século ou ainda prenúncios de vanguarda no mesmo pé que os primeiros sintomas da literatura massificada, mas também avaliar a diversidade como a particularidade de interesses de um escritor como o autor d’Os Gatos, e ainda dar fé do pensamento intelectual português e europeu na transição do século XIX para o século XX, incluindo os domínios da ciência e das técnicas, da organização social e económica, das correntes políticas como artísticas.
A presente mostra bibliográfica procura potenciar esse objeto de análise, sugerindo modos de leitura do bibliófilo e relevando algumas das parcelas dessa biblioteca como instrumento do seu utilizador, exemplo de uma cultura de elite». In Biblioteca Nacional de Portugal.

Cortesia de BNP/JDACT