segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Hidráulica Monástica Medieval e Moderna. Actas do Simpósio Internacional. «Os aquedutos para abastecimento público alimentavam chafarizes e, mais tarde, lavadouros, sendo muitos dos primeiros de grande beleza, com destaque para o das Portas de Moura (1556) e o da Praça do Geraldo (1571), ambos situados em Évora e construídos de mármore»

Cortesia de foriente

Introdução
«O estudo foi limitado ao início do século XVIII por assim corresponder a um período em que a concepção, o projecto e a exploração das obras hidráulicas se orientavam por conhecimentos essencialmente de natureza empírica, tanto no domínio da Hidráulica como no da Resistência de Materiais. Com efeito, foi no século XVIII que se deu um progresso importante do conhecimento científico nesses domínios.

Abastecimento doméstico e público
As grandes obras para o abastecimento de água doméstico ou público foram iniciadas em Portugal pelos Romanos:
  • barragens, aquedutos, tanques e cisternas.
O inventário sistemático e a caracterização dessas obras a sul do Tejo foi realizado por Quintela ‘et al’. (1986). Menção especial merecem as barragens, de que se inventariaram vinte e uma de alvenaria irregular (‘opus incertum’) ou de betão de cal hidráulica (‘opus caementicium’). As alturas dessas barragens têm o valor máximo de 5,2 m e o valor mediano de 3,0 m (‘ibidem’). As barragens destinavam-se, em geral, a criar pequenas albufeiras para regularização do caudal de cursos de água pouco importantes, secos durante uma parte considerável do ano. As maiores albufeiras eram as das barragens do Muro, do Muro dos Mouros e de Pisões, com capacidades em relação ao actual coroamento de 178 000, 80 000 e 38 000 m3 respectivamente.
A finalidade das albufeiras teria sido essencialmente fornecer água para o abastecimento de ‘villae’ (utilização doméstica, termas, pecuária, rega de pequenas hortas e pomares).
A norte do Tejo são conhecidas obras hidráulicas romanas com importância, não tendo, porém, sido feita a sua inventariação sistemática. Destaca-se o aqueduto de ‘Conimbriga’, com desenvolvimento de cerca de 3500 m, seguindo ao nível do terreno, sobre um muro e, nos últimos 170 m, sobre arcarias e ainda barragens de terra cuja água teria sido utilizada em explorações mineiras (Quintela ‘et al’., 1993).

Cortesia de foriente e auladeliteraturaportuguesa

Após o período romano, a construção em Portugal de grandes obras hidráulicas para o abastecimento público ou doméstico foi retomada na Renascença. Os mais importantes aquedutos construídos com a referida finalidade até final do século XVII são os de Setúbal, da Água da Prata (Évora), da Amoreira (Elvas), de Óbidos, dos Pegões Altos (ou de Tomar), de Torres Vedras e de Serpa (Caetano, 1991).
Distinguem-se, quer pela monumentalidade dos trechos em arcaria, quer pelo comprimento total, os aquedutos da Amoreira, da Água da Prata e dos Pegões Altos, perfazendo comprimentos totais respectivamente de 7,1; 18,1 e 5,0 km. Neles se envolveram importantes mestres de obras ou arquitectos:
  • Francisco de Arruda nos dois primeiros,
  • Filipe Térzio no terceiro.
O aqueduto da Amoreira tem um comprimento sobre arcaria de 1630 m, que atinge a altura máxima de 31 m. É reforçado por contrafortes que não existiam inicialmente, pelo menos com a forma actual. As obras foram iniciadas provavelmente em 1529 e, a mando de D. João III, passaram a ser dirigidas em 1537 por Francisco de Arruda. Em 1542, a água transportada pelo aqueduto chegava ao Outeiro, tendo-se posto a opção, para vencer o vale do Rocio, entre as soluções de arcaria (necessariamente alta e dispendiosa) ou de sifão invertido. Foi preferida a primeira porque na segunda "o peso da água, actuando nas paredes dos canos, os romperia de vez em quando".
A construção deste aqueduto sofreu posteriormente inúmeras vicissitudes, pelo que a água só entrou em Elvas em 1622.

Os aquedutos para abastecimento público alimentavam chafarizes e, mais tarde, lavadouros, sendo muitos dos primeiros de grande beleza, com destaque para o das Portas de Moura (1556) e o da Praça do Geraldo (1571), ambos situados em Évora e construídos de mármore.


Cortesia de foriente e cd3wd

Rega
Os Lusitanos, segundo Estrabão, cultivavam o linho e, portanto, deveriam ter recorrido à rega, exigida por aquela planta no território português. Admite-se, assim, que o início da rega nesse território tenha sido devido aos Celtas que começaram a chegar à Península Ibérica no século VI a.C. Admite-se também que, por influência céltica, se tivesse iniciado, nas zonas montanhosas do Norte, a rega contínua durante o Inverno (rega de ‘lima’) de lameiros e de prados, para defesa dos mesmos contra as baixas temperaturas e a geada.
No tempo dos Romanos, os regadios não deveriam alargar-se para além das necessidades de manter efectivos pecuários e pequenas hortas associadas às ‘villae’. Com esta finalidade terá sido utilizada a água de algumas das albufeiras criadas pela barragens romanas construídas no território português (Quintela ‘et al’, 1986). Seria excepção o linho que teve então cultura extensa, bem como os lameiros e os prados.
Os Visigodos continuaram os procedimentos dos Romanos no que respeita à agricultura (e a outras actividades). Os Muçulmanos praticaram largamente a rega no território português, predominantemente com água extraída de poços, de onde era elevada por engenhos, especialmente cegonhas e noras de tracção animal. Tendo em conta que a sua permanência a norte do Douro não excedeu um século, o regadio muçulmano só se instalou com importância no Algarve e nos arredores saloios de Lisboa.
Sancho I promoveu o povoamento do território, tendo-se preocupado especialmente com o enxugo de pântanos e a rega de terrenos, e estabeleceu regulamentação relativa à utilização da água». In António Carvalho Quintela, Breve Caracterização das Obras Hidráulicas e da Utilização da Água em Portugal anteriormente ao Século XVIII, Hidráulica Monástica Medieval e Moderna, Convento da Arrábida, 1993, Fundação Oriente, 1996, ISBN 972-9440-49-2.

Cortesia da F. Oriente/JDACT