domingo, 15 de janeiro de 2012

Cidade Romana. Bracara Augusta. Manuela Martins. «Os vestígios arqueológicos mais antigos conhecidos no sítio de Braga datam do Bronze Final. Estão representados por fossas e cerâmicas procedentes do Alto da Cividade, onde deve ter existido um povoado e por uma presumível necrópole identificada na área dos Granjinhos, na vertente Sul»

Cortesia de uadauniversidadedominho

Antes de Bracara Augusta
«Entre 138-136 a.C. o cônsul romano Junius Brutus comanda a primeira expedição militar ao NW da Península Ibérica. Segundo fontes históricas, depois de passarem o Lima e atingirem o rio Minho, as legiões romanas terão retrocedido para Sul, envolvendo-se em feroz batalha contra os “Bracari”, um dos povos mais importantes que habitavam a Norte do rio Douro. Este povo, referido por Apiano, possuiria um extenso território que se estendia, talvez, entre Douro e Cávado, habitando, tal como os outros povos conhecidos no Noroeste da Península, em povoados fortificados.
Nos dois últimos séculos antes da nossa era, estes povoados sofrem um grande desenvolvimento agrícola, artesanal e comercial, dotando-se de uma complexa arquitectura que tem a sua melhor expressão nas fortificações.
Aniquilados os derradeiros focos de resistência peninsular, concentrados sobretudo na zona das Astúrias e Cantábria (27-24 a.C.), impôs-se ao imperador Augusto a organização administrativa do NW peninsular e a integração das suas populações no mundo romano. A fundação de cidades e a construção de vias foram alguns do meios utilizados na concretização desses objectivos, que consolidaram o poder de Roma e aproximaram as populações indígenas da região dos restantes habitantes do Império. A criação de “Bracara Augusta” insere-se nesta política do imperador Augusto.

Os vestígios arqueológicos mais antigos conhecidos no sítio de Braga datam do Bronze Final. Estão representados por fossas e cerâmicas procedentes do Alto da Cividade, onde deve ter existido um povoado e por uma presumível necrópole identificada na área dos Granjinhos, na vertente Sul. Apesar destes vestígios é pouco provável que a implantação da cidade se tivesse sucedido a um castro proto-histórico, pois o local não possui as condições topográficas adequadas para a fixação desse tipo de povoados.


Cerâmica da Idade do Bronze encontrada nas escavações realizadas nos Granjinhos
Museu de Arqueologia Diogo Sampaio (doravante, MDDS)
Cortesia de uadauniversidadedominho

Fundação e desenvolvimento de Bracara Augusta
Bracara Augusta foi fundada pelo imperador Augusto, no fim das guerras cantábricas, no âmbito do programa imperial de reorganização administrativa da Península Ibérica, provavelmente no ano 16 a.C.. Assim, tal como as restantes criações augústeas no Noroeste, “Bracara Augusta” nasceu da necessidade de dotar a região a Norte do Douro de estruturas sociais e políticas susceptíveis de firmar a presença romana e facilitar a integração das suas populações. Enquanto que os dados arqueológicos disponíveis permitem afirmar que “Bracara Augusta” surgiu “ex nihilo”, o material epigráfico conhecido sugere um contexto religioso para a sua criação, fortemente influenciado pelo carisma de Augusto e pela difusão do culto imperial.

Plínio inscreve “Bracara Augusta” na lista dos “oppida” peregrinos. No entanto, é provável que a nova colectividade tivesse centralizado, logo desde a sua fundação, importantes funções de carácter jurídico, religioso e económico, articuladas com as suas atribuições enquanto sede de convento jurídico. Por outro lado, permanece discutível o estatuto da cidade e dos seus habitantes. De facto, tradicionalmente considerou-se que “Bracara Augusta” teria sido promovida a município no último quartel do século l. Este facto teria beneficiado os seus habitantes com o direito latino, o que permitia a ascensão da aristocracia indígena à cidadania romana. No entanto, é possível que “Bracara Augusta” tenha sido criada já com direito latino, facto que teria beneficiado, logo de início, a aristocracia indígena residente. De qualquer modo, ou por privilégio de fundação ou, mais tarde, por promoção municipal, “Bracara Augusta” terá possuído estruturas de governo autónomas, com senado e magistrados.


Divisão sdministrativa da Hispânia; províncias, conventos e cidades
Cortesia de uadauniversidadedominho

Os dados arqueológicos e epigráficos apontam para um considerável desenvolvimento da cidade, ao longo da dinastia júlio-cláudia, sendo admissível que durante a primeira metade do século I se tivesse operado um povoamento sistemático do novo aglomerado, tendo então sido erguidos alguns dos seus edifícios públicos.
A Arqueologia testemunha que “Bracara Augusta” era uma cidade ortogonal, com ruas bem alinhadas, orientadas NW/SE, algumas das quais com pórticos que envolviam as “insulae” (quarteirões) em que se dividia o espaço urbano. A luz dos resultados das escavações realizadas em vários locais do perímetro urbano podemos afirmar que “Bracara Augusta” terá atingido a sua máxima extensão no século II.

Inscrição do tempo de Augusto conservada numa parede da Sé Catedral
CONDITVM. SVB/ IMP(eratoris). CAESARIS. PATRIS. PATRI(AE)
Moedas de ‘caetra’, cunhadas no tempo das guerras cantábricas (MDDS)
Cortesia de uadauniversidadedominho

Pouco sabemos da Primitiva cidade, da época de Augusto e do período Júlio-cláudio. Pelo contrário, são abundantes os vestígios de construções da época Flávia-antonina. O surto urbanístico e a monumentalização de “Bracara Augusta”, entre finais do século I/meados do II, realizados certamente a expensas municipais, foram acompanhados pelo florescimento das actividades económicas, associadas, quer ao abastecimento de uma população crescente , com razoável poder de compra, quer ao escoamento regional de produtos fabricados na cidade.

As importações estão bem representadas por cerâmicas, vidros e por objectos de adorno. Alguns produtos importados revelam mesmo, Pela sua grande qualidade, que em “Bracara Augusta” residiu, durante o Alto Império, uma clientela abastada, de refinado gosto, que constituiria, certamente, a elite da cidade. Muito embora pouco se saiba sobre as exportações, podemos destacar, entre as actividades artesanais mais representativas, o fabrico de cerâmica comum de apreciável qualidade, de vidro e de metais». In Bracara Augusta Cidade Romana, Manuela Martins, Unidade de Arqueologia da Universidade do Minho, 2000, ISBN 972-9382-10-7.

continua
Cortesia da UA da Universidade do Minho/JDACT