sábado, 14 de julho de 2018

O Faraó Negro. Christian Jacq. «Tendo conseguido o resultado esperado, não deveremos contentar-nos com ele? Tefnakhte ordenou ao seu escanção que servisse cerveja forte aos príncipes líbios»

jdact e cortesia de wikipedia

«(…) Tefnakhte sentiu desejos de estrangular o cobarde, mas conseguiu conter a sua fúria. Ainda não dispunha de forças armadas suficientes para agir sozinho e tinha que transigir com aquele bando de bárbaros de vistas curtas. Compreendo a tua prudência, Akanosh. Até hoje, mantínhamo-nos no norte do país e deixávamos o Sul para Piankhi, considerando o Médio Egipto como uma zona neutra. Para gozar de felicidade e prosperidade, o Egipto deve estar unido e governado por um autêntico faraó. Pensar que possamos continuar a viver divididos é um erro fatal. Perderemos o que possuímos! Não existe outra solução a não ser a conquista do Sul e a eliminação das tropas do faraó negro. É essa a tua opinião e respeito-a, Tefnakhte. mas tens perante ti diversos soberanos independentes que dirigem os seus principados como muito bem entendem. Por que hão-de contestar a minha a autoridade, quando estamos no caminho de uma grande vitória? Uniste-nos numa federação admitiu Akanosh mas não te foi concedido o poder supremo. Queríamos tentar uma experiência, sair do Delta, apoderarmo-nos de Mênfis que caiu nas nossas mãos como um fruto maduro e conquistar algumas províncias do Médio Egipto.
Tendo conseguido o resultado esperado, não deveremos contentar-nos com ele? Tefnakhte ordenou ao seu escanção que servisse cerveja forte aos príncipes líbios. A maior parte deles apreciaram essa diversão, mas Akanosh recusou-se a beber. Vencemos sem combater lembrou. As aldeias que atravessámos não podiam opor-nos a menor resistência. Heracleopólis é uma cidade fortificada que será defendida por uma guarnição formada por soldados experientes. A quantos homens se elevarão as nossas perdas e estaremos todos de acordo para consentir em semelhante sacrifício? É esse o preço de uma conquista declarou Tefnakhte. Negá-lo seria mentir, mas recuar seria uma derrota. Desejamos reflectir e discutir o assunto. Tefnakhte ocultou a sua decepção. As reuniões dos chefes líbios perdiam-se sempre em palavreados intermináveis que não conduziam a nenhuma decisão concreta. Nesse caso, respondam claramente à minha pergunta: concedeis-me ou não plenos poderes para empreender a conquista de todo o Egipto? Akanosh ergueu-se e retirou-se para a sua tenda, seguido pelos outros chefes líbios. Iniciava-se para Tefnakhte uma longa espera. Enraivecido, quebrou o ramo baixo de uma tamargueira cujos pedaços atirou para longe. Depois, seguiu em passo apressado até à sua própria tenda onde o esperavam os seus dois inseparáveis conselheiros, Yegeb e Nartreb, dois semitas que formavam um estranho par. Yegeb era grande, tinha braços intermináveis, um rosto todo em comprimento e tornozelos inchados; Nartreb era pequeno, gorducho, tinha os dedos das mãos e dos pés gordinhos como os de um bebé, um rosto redondo e pescoço forte.
Astuto e calculista, mais velho do que Nartreb, Yegeb dava-lhe os conselhos de que necessitava para agir, visto que o seu cúmplice dispunha de uma energia inesgotável e não hesitava em utilizar fosse que meio fosse para enriquecer. Embora tão corrupto como Nartreb, Yegeb afirmava constantemente a sua perfeita honestidade; vestia-se com roupas velhas, comia pouco e pretendia ser muito desligado das coisas materiais. Uma única paixão o dominava: o gosto pela manipulação e pelo poder oculto. Com o apoio de Nartreb, incitava Tefnakhte a tornar-se o soberano incontestado das Duas Terras, convencido que os recompensaria se tal acontecesse. Corre tudo bem?, perguntou Nartreb, ocupado a mastigar uma haste de papiro. Aqueles imbecis decidiram discutir revelou Tefnakhte. Não podia acontecer nada pior reconheceu Yegeb, coçando o nariz. O resultado das deliberações não oferece qualquer dúvida: a ofensiva será interrompida e regressaremos ao norte. Qual é a vossa proposta? Há muitos anos que aprendemos a conhecer esses medíocres déspotas líbios e não nos faltam meios de acção. Utilizem-nos ordenou Tefnakhte.
O jovem núbio mergulhou no Nilo em perseguição dos búfalos que brincavam na corrente e corriam o perigo de se afogar. Era pelo menos o que Puarma tinha declarado, com convicção, para as deslumbrar, a três lindíssimas raparigas, de pele acobreada. Nuas, preparavam-se para se deliciarem numa bacia natural, entre dois rochedos, quando os búfalos cheios de calor galoparam para o rio. Pertenciam a um primo de Puarma, decidido a apanhar os fugitivos sob o olhar das raparigas fascinadas». In Christian Jacq, O Faraó Negro, 1997, Bertrand Editora, 1998, ISBN 978-972-251-049-3.

Cortesia de BertrandE/JDACT