A
Monarquia Nova e o Congresso de Setúbal
«(…) Um dos aspectos a ter em conta era o do
apoio externo após a revolução. Nesse sentido, em Abril de 1910, reuniu-se um novo Congresso em que foi nomeada uma comissão
encarregada de ir ao estrangeiro expor e tornar conhecidos o programa do
partido e as intenções dos seus dirigentes quando se desse a mudança inevitável
do regime. Um dos pontos essenciais da referida missão consistia em garantir na
Inglaterra que, no caso de um triunfo republicano, seria mantida, nas mesmas
bases, a aliança tradicional entre os dois países, para assegurar a não
interferência da nossa velha aliada em defesa do trono. A missão republicana
deslocou-se ainda a outros países, tendo distribuído pelos principais órgãos da
imprensa internacional um relatório sobre a situação política portuguesa.
O 5
de Outubro de 1910
As forças armadas, consideradas
indispensáveis para levar a efeito uma acção revolucionária, foram um campo
importante de recrutamento para os ideais republicanos. O aliciamento da maior
parte dos oficiais ficou a dever-se ao vice-almirante Cândido dos Reis. A acção
conjunta deste, no Comité Militar Republicano com Machado Santos na Carbonária tornou possível
infiltrar simpatizantes em várias unidades da Guarnição de Lisboa: Artilharia
1, Infantaria 2, Infantaria 5, Infantaria 16, Cavalaria 2 (Lanceiros),
Cavalaria 4, Caçadores 2, Caçadores 5, Regimento de Engenharia, Guarda Fiscal e
corpo de marinheiros, incluindo a guarnição dos três cruzadores surtos no Tejo
(Adamastor, São Rafael e D. Carlos) e base de torpedeiros em Vale do
Zebro. Cândido dos Reis não estava muito convicto de que os republicanos
dispusessem do apoio militar suficiente para o triunfo da revolução, mas Machado
Santos, continuava entusiasmado e queria avançar para a luta armada, o mais
cedo possível. Após o trabalho de recrutamento passou-se à elaboração do plano
do movimento revolucionário, para o qual concorreram três oficiais de carreira:
o capitão Sá Cardoso e os tenentes Hélder Ribeiro e Aragão Melo. A cidade foi
dividida em zonas para as quais se disporia de 60 grupos de civis, cada um
deles constituído por 16 homens, 5 armados com 5 bombas cada um, 5 com
pistolas-metralhadoras e 6 desarmados que tinham por missão a vigilância e a
transmissão de ordens. A esta organização
civil juntava-se a preparação militar do golpe que tinha como objectivo o
ataque simultâneo a três pontos considerados fundamentais: o Quartel do
Carmo, o Quartel-General e o Palácio Real das Necessidades, onde o rei devia
ser preso. Duas notícias precipitaram a revolução: o assassinato de Miguel Bombarda que estava incumbido da
distribuição de armas aos grupos civis, e a informação, dada a Cândido dos Reis,
de que os navios que estavam no Tejo iriam sair no dia 4. Perante estas
notícias e a informação de que a Guarnição de Lisboa estava a ser posta de
prevenção alguns oficiais republicanos desaconselharam a revolução, mas Cândido
dos Reis e Machado Santos resolveram avançar. O plano traçado não se
concretizou, porque se foi fácil para os revolucionários apoderarem-se de Infantaria
16, Artilharia 1 e do Quartel de Marinheiros em Alcântara, não conseguiram,
contudo, sublevar a maior parte das unidades. De início as coisas não pareciam
correr bem para os revoltosos. Desde logo, o sinal de três tiros de canhão que
marcaria para civis e militares o momento de avançar falhou. Apenas um tiro foi
ouvido e Cândido dos Reis que esperava o sinal para embarcar e assumir o
comando dos navios, perante o silêncio que se seguiu, convenceu-se do malogro
da revolução e, pouco depois, suicidava-se.
Com as tropas sublevadas que se tinham
concentrado na Rotunda, também as coisas não começaram por correr bem. Face à
ausência dos principais dirigentes republicanos e aos boatos que começavam a
circular, os capitães Sá Cardoso e Afonso Palla, com outros oficiais,
consideraram que deveria levantar-se o acampamento, mas Machado Santos
recusou-se a desistir e manteve-se sozinho no comando. A pouco e pouco, os
civis e soldados ajuramentados na Carbonária
começaram a juntar-se aos revoltosos na Rotunda, assegurando a resistência. A
revolta da esquadra sita no Tejo contribuiu decisivamente para a vitória
republicana. Por outro lado, logo no início da revolução os carbonários tinham
desligado os fios telegráficos impedindo o Governo de pedir reforços vindos de
fora. As linhas férreas também tinham sido cortadas, impossibilitando o avanço
de tropas, enquanto que do Sul também não podiam chegar reforços, já que os
navios revoltados dominavam o Tejo. No fim do dia 4, a situação das
tropas fiéis ao Governo no Rossio, era difícil. Os navios tinham rumado para
perto do Terreiro do Paço. Ao fim da tarde, o São Rafael fez fogo sobre
os ministérios desta praça, provocando o pânico nas hostes monárquicas que se
sentiam entre dois fogos, com os republicanos de Machado Santos na Rotunda e os
navios frente ao Terreiro do Paço. Perante o evoluir dos acontecimentos e
depois dos bombardeamentos dos navios sobre o Palácio das Necessidades, o rei,
a conselho de Teixeira Sousa, abandonou Lisboa, para que as tropas que defendiam
o Paço pudessem ir auxiliar nos combates na Rotunda e no Rossio.
Na manhã do dia 5, após um cessar fogo de uma hora, pedido
pelo encarregado de negócios alemão para embarcar os estrangeiros residentes em
Lisboa, ocorria a rendição das tropas monárquicas perante Machado Santos. Pouco
depois, era proclamada a República no edifício da Câmara Municipal
de Lisboa». In Maria C. Proença e Luís Farinha, República e Republicanismo,
Instituto Camões, Março 2009.
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